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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

THIAGO MEDEIROS
( Brasil – Pernambuco )

Pernambucano de Caruaru.
Escritor, poeta, ensaísta, cronista, compositor e agitador cultural.
Idealizador do Encontro Literário Letras em Barro.  Ministrante de oficinas literárias.  Publicou o livro de contos "Claro É O Mundo À Minha Volta"  Editora Patuá.
Lançou em 2020 a coletânea de poemas "Cidade Finada", Editora Telucazu.  Organizou a antologia "Nós Que Aqui Estamos – Nordeste", pela editora caruaruense Arrelique.  Lançou, no final de 2021,
"Sou a Pronúncia do Teu Nome", pela Editora Urutau.
Colaborador da Carnavalhame, na quel mantém a coluna semanal "Vista do Apartamento 101".
Escreve para não esquecer de si mesmo.

 

POETICOIA  11/2022.       Inclui os poetas Jovina Benigno, Auzana Pagot, Dora Lampert, Ferreira Lima,  R. Brossa, Thiago Medeiros.   São Paulo: OIA editora, 2022.   92 p.         14 x 20,5 cm. 
ISBN 978-85-84-84945-01-2                      
Ex. bibl. Antonio Miranda




DAS COSTURAS NÃO ME CABEM O PEITO

 

toda ferida
cicatriza

— menos as
chagas
de cristo

e
ando desalentado
tão distante
de santidades —

então me remendo

remendo
remendo
remendo

em linhas de seda
em linhas de trapos
em linhas de quetiapina
em linhas de álcool

nunca o peito

costuro sobras
dos meus pés,.

envelhecidos
tão antes que
outros restos
do meu corpo

a boca do mundo
não me deseja
engolir os pés

meu costume
quase sagrado
de mantê-los
frios e descalços

sujeito à necroses
das horas

e

das sombras inacabadas
de todos os amores

mortos

me permite sempre
remendá-los

em linhas de seda
em linhas de trapos
em linhas de quetiapina
em linhas de álcool

 

 

DIAS DEPOIS SAÍMOS DO LEPROSÁRIO

há dias não escrevo
sobre nós e não havia
percebido este novo
falecimento por não
saber em qual fase do
luto estagnamos nosso
involuntário esmorecer

(foi sábia decisão
de ignorarmos definitivos)

interrompi a contagem dos
mortos lá fora em quinhentos
e cinquenta mil, por não suportar
apneia pelos próximos quatro
meses

é agosto, mas já poderia ser
dezembro, pois na verdade
nunca deixou de ser março
nem nunca deixou de ser
aquele dia de nossa fuga
na qual abandonamos flores
nas calçadas

(não há mais vestígio de
pétalas em lugar algum)

sobre nós, nossa contagem
particular, este é o nosso
décimo nono derradeiro, ou
ainda seja o décino quinto,
embora recorde algum dia
ter contado, sempre em apneia,
até vinte e três ou vinte e nove

tenho vestido calça jeans, meias
e prováveis sombras a prova d´água
sobre os olhos, apenas para esconder
o desastre do corpo, apesar de estar
em apneia, sinto tudo oxidar e me
rasgarem novas rugas entre as costelas
e os pés, finalmente calçados, pois
desisti, sei muito bem, não me permito
às raízes, não solo fértil, nosso mais
recente falecimento relegou apenas
a esterilidade dos adubos e a secura dos
pés encaliçados nessas longas caminhadas
do quarto à sala e a qualquer lugar que me
reflita o rosto — tenho vontade de esquecê-lo,
talvez por conta dos nossos baixos padrões
na severa insuportabilidade dos cativeiros

quero esquecer o rosto que tive ao
longo desses dias, e é justo que seja
assim e, caso um dia aconteça, prometo
não contabilizar mais este morredouro
na contagem uníssona das nossas
ausências, basta o finamento de nosso
idioma, basta o ocaso dos nossos nomes
e basta o fato de termos escrito nossa
narrativa sob a inconstância dos lápis,
pois sumiram caneta e nanquim
quando um dia dissemos é aqui o marco
dos ajustamentos  improváveis, então
concordamos, implícito mas, concordamos,
não importa que seja efêmero, apenas não
recordo se concordamos que seria curto

é tudo sobre encerramentos e minha
exaustão sobre números — os nossos
vinte e nove e os quinhentos e cinquenta
mil á fora, isso quando desisti das
contagens, por não suportar apneia
pelos próximos quatro meses — porque
não sei por qual vocativo devo chamar
você, e porque é impossível, meu bem
que já estejamos em agosto, é impossível

estarmos tão próximos a dezembro se ainda
é março, sei que ainda é março, jamais
saímos de março, é impossível estarmos a onze
dias de setembro se havia um abril inteiro a ser
atravessado, desde a sua primeira mentira até os
vinte e nove dias que nunca vieram, ainda assim
tenho maturado um novo desespero, meu bem,
desde a noite passada guardo uma certeza, pois
rendi incertezas ao seu vocativo, e estou certo,
meu bem, estou certo

a filha de minha filha,
e os filhos dos meus filhos,
que provavelmente não conheceremos,
ainda usarão máscaras ao brincar nas ruas,
e continuarão minha contagem interrompida em
quinhentos e cinquenta mil dos mortos lá fora,
e contarão um ao outro o que exatamente deixamos
morrer em nosso trigésimo falecimento ritualístico,
e ainda será o mesmo mês de março, porque março é
imorredouro, março é a insistência da língua no
pouco palpável, março é um cristo ressurreto aos domingos

e a filha da minha filha, e os filhos dos
seus filhos, jamais conhecerão os significados do
mês de abril, nem guardarão expectativa em relação
a dezembro, nem viverão a proximidade das desistências
trazidas no mês de agosto, porque ainda será o mesmo
mês de março, nunca haverá mais nada depois de março,
será sempre aquele mês de março no qual permiti esquecer
meu rosto e não suporto manter apneia pelos próximos
quatro meses.


*

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Página publicada em outubro de 2022


 

 

 
 
 
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